quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

O Bolhão e a escolha de Elisa

Na passada quinta-feira, 19 de Fevereiro, Elisa Ferreira apresentou-se ao Porto como candidata à Câmara Municipal. A sessão, que decorreu na Alfândega, foi muito participada, emotiva, inteligente e promissora. Em próximos posts se justificará cada uma destas características.

Por agora, interessa relevar que o primeiro passo público da pré-campanha foi dado anteontem, numa pausada visita de trabalho ao Bolhão, sem a presença da comunicação social, para ouvir directamente as pessoas. Não foi por acaso. Por um lado, a candidata cumpriu um desejo manifestado pelos vendedores e comerciantes, há quase um ano, num debate promovido pelo MICporto, realizado nos Fenianos, e que contou com a presença de representantes do PCP, do BE e do PS. Por outro lado, escolheu um espaço simbólico: em torno da defesa e requalificação daquele património arquitectónico e humano é possível unir simpatizantes daqueles partidos, mobilizar muitos independentes, recolher 50.000 assinaturas e demonstrar que a resistência cívica e o associativismo não foram vencidos pela obsessão privatística municipal.

Se este exemplo de participação e unidade genuínas em torno do Bolhão pode apontar novos horizontes aos outros "bolhões" da cidade (Mercado do Bom Sucesso, Palácio de Cristal, Praça de Lisboa, Museu da Indústria do Freixo, Bairro do Aleixo, etc.), a escolha de Elisa também pode representar a mudança necessária para o Porto.

Dualização social e níveis de escolarização dos portuenses

(faça click sobre o gráfico para o ver melhor)
Já aqui nos referimos à elevada percentagem de analfabetismo como traço significativo da população portuense. Se um tal facto é, por si só, inaceitável nos tempos que correm, maior é a indignação quando constatamos que um em cada quatro residentes tem como nível máximo de escolarização apenas o 1º ciclo do ensino básico (antiga escola primária).
A análise por freguesias dos níveis de escolarização reforça aquilo que já tínhamos concluído a propósito do analfabetismo: para uma parte significativa da população, os locais de residência marcam os limites de acesso a níveis mais elevados de educação.
Dois pares de exemplos bastam para para tirarmos esta ilacção! Comparemos as "estruturas escolares" de, por um lado, Campanhã e Cedofeita e, por outro lado, Bonfim e Nevogilde:
Campanhã apresenta-se como uma pirâmide direita, de base larga (1º ciclo - 34%; 3º ciclo - 14%; ensino secundário - 11%; licenciatura - 4%) enquanto Cedofeita representa quase um cilindro (1º ciclo - 20%; 3º ciclo - 15%; ensino secundário - 19%; licenciatura - 14%). Bonfim é também uma pirâmide direita, embora mais "achatada", ou seja, com diferenças menos acentuadas que Campanhã (1º ciclo - 24%; 3º ciclo - 15%; ensino secundário - 17%; licenciatura - 10%) ao passo que Nevogilde se apresenta como uma pirâmide invertida (1º ciclo - 12%; 3º ciclo - 12%; ensino secundário - 21%; licenciatura - 22%).
Chegaríamos a disparidades idênticas se a comparação fosse feita entre Miragaia (ou qualquer outra das freguesias do centro histórico) e Foz do Douro, ou entre Aldoar e Massarelos.
De tudo isto se pode concluir que a dualização urbana e social, provocada nas décadas de 60 e 70 pela deslocação compulsiva para os grandes bairros camarários de Aldoar, Ramalde, Campanhã e Paranhos, da população trabalhadora que anteriormente habitava nas freguesias do centro histórico e nas vizinhas, ainda se mantém (e reforça) , mas agora em estreita relação com as desigualdades no acesso a níveis mais elevados de escolarização. A consequência mais dramática de tudo isto é a repercussão do "fenómeno" junto das crianças e jovens que hoje estão em idade escolar.
Na medida em que esta questão é crucial para compreendermos a relação da cidade com a educação, voltaremos a abordá-la mais em detalhe em próximos posts.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Ouvir as árvores



Joana sabia que a árvore estava a gritar.
Vinha, a moça, pequenina de estatura, de uma longa estirpe celta, de druídas das florestas. Da procura do musgo, dos remédios, das tisanas e das curas. Da procura do bem e da luta contra as causas obscuras.
A floresta estava-lhe no corpo esguio…mata plantada de pequenas ervas rasteiras, onde aparecem buracos curiosos e curiosas toupeiras, crescem arbustos ásperos…até árvores de folhagem perene, espaçadas e serenas, exibindo o porte frágil.
Naquela tarde, quente, de exercícios e simulações, pequenas palestras e instruções… e o vai e vem “das formigas no carreiro”, levando sementes para o formigueiro…Tudo parecia resumir-se ao silêncio de uma brisa…
E, a moça ouvia a árvore, muito nova, gritar:
- Joana, este ano, quero crescer e o infinito alcançar! Não posso arder, ninguém me pode queimar!

Carinhosamente, ao fim da tarde, Joana deixou o seu capacete vermelho, dos voluntários, junto ao pé daquela árvore para a marcar e proteger. Os bons espíritos verdes, de prevenção na floresta, iriam entender…


19 de Maio de 2006
José Carlos Martins

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

É preciso que o sistema responda! Qual sistema...?


Os cínicos, sorrindo, dizem que "eles" dormem ao relento porque gostam, "estão cheios de álcool e até já não sentem o frio!". Os senhores de posição abanam a cabeça lateralmente, da esquerda para a direita e da direita para a esquerda, repetidas vezes, com um ar sério e indignado e exclamam alto para as suas senhoras: "Parece impossível! Isto não devia ser permitido! Este espectáculo no centro da cidade e a polícia não faz nada!". As beatas, a medo, pé-ante-pé, abeiram-se, sussurram, deixam uma moeda de 0,50 € junto da mochila sem fazer ruído não vão "eles" acordar, benzem-se, suspiram e decidem : "Coitadinhos...!". A rapariguinha do shopping, petulante e apressada, passa perto, franze o nariz mas não tira os ouvidos do telemóvel-último grito! Os militantes da sopa dos pobres já "os" conhecem e explicam: "São as estruturas, pá! É o sistema que não responde, pá!. Isto, com a crise e o desemprego, vai piorar, pá!"
E, enquanto o frágil sol matinal de Janeiro "lhes" aquece as mãos, o manto diáfano da PORTO Lazer, E.M., abriga-os da nortada gelada.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Fazer do Porto uma cidade livre de analfabetismo

Apesar de o analfabetismo ter diminuído em Portugal 17% nos últimos 30 anos, em 2001, segundo o INE, o número de analfabetos estava nos 9%, sendo a repartição entre homens e mulheres bastante diferente (11,5% para as mulheres contra 6,3% para os homens).
Na cidade do Porto, para além desta desigualdade de género face "ao saber ler e escrever", uma outra era, e continua a ser, eloquente: a que se reporta aos locais (freguesias) de residência.
O município tem uma média global de 4,79% de analfabetos, mas no seu interior as percentagens variam entre um mínimo de 1,50% em Nevogilde e um máximo de 8,81% na Sé. O mapa mostra que as cinco freguesias do centro histórico e a freguesia mais oriental (Campanhã), com valores superiores a 5%, representam a zona urbana onde menos se fizeram sentir os benefícios da educação e da escolarização.Mas não só: é nessa zona que "mora" a velhice solitária, a pobreza assistida pelas IPSS, o desemprego sem subsídio, a má habitação, a falta de planeamento urbano...
No outro extremo estatístico e social, as freguesias de Nevogilde, Foz do Douro, Massarelos e Cedofeita, com valores inferiores a 4%, representam a zona de elevado capital educativo e cultural acumulado ao longo de várias décadas.
No meio, entre os 4% e os 5%, estão as freguesias de Aldoar, Lordelo do Ouro, Ramalde, Paranhos e Bonfim, onde coexistem gerações, emprego e desemprego, velhos e novos bairros sociais, traços de ruralidade e símbolos maiores da modernidade. É aí que pontificam os divergentes destinos escolares e sociais da maioria das crianças, jovens e adultos da cidade.
Se a história da cidade explica, em parte, este quadro desolador, é às políticas públicas locais e centrais que se tem de exigir as explicações que faltam. É, também, ao associativismo e aos privados que se tem de perguntar o que têm feito. Mas não basta conhecermos os nós do problema. É urgente tornar o Porto uma cidade livre de analfabetismo!
Voltaremos a este assunto em próximos "posts"